domingo, 7 de dezembro de 2008

Indigno


Não me indigno, porque a indignação é para os fortes;
não me resigno, porque a resignação é para os nobres;
não me calo, porque o silêncio é para os grandes.
E eu não sou forte, nem nobre, nem grande.
Sofro e sonho.
Queixo-me porque sou fraco e, porque sou artista,
entretenho-me a tecer musicais as minhas queixas
e a arranjar meus sonhos conforme me parece melhor a minha ideia de os achar belos.
Só lamento o não ser criança, para que pudesse crer nos meus sonhos,
o não ser doido para que pudesse afastar da alma de todos os que me cercam,
E tomar o sonho por real,
viver demasiado os sonhos deu-me este espinho à rosa falsa de minha sonhada vida: que nem os sonhos me agradam, porque lhes acho defeitos.
Nem com pintar esse vidro de sombras coloridas
me oculto o rumor da vida alheia ao meu olhá-la, do outro lado.
Ditosos os fazedores de sistemas pessimistas!
Não só se amparam de ter feito qualquer coisa,
como também se alegram do explicado, e se incluem na dor universal.
Eu não me queixo pelo mundo.
Não protesto em nome do universo.
Não sou pessimista.
Sofro e queixo-me, mas não sei se o que há de mal é o sofrimento
nem sei se é humano sofrer.
Que me importa saber se isso é certo ou não?
Eu sofro, não sei se merecidamente.
(Corça perseguida.)
Eu não sou pessimista, sou triste.
Fernando Pessoa

Paulo Braccini
enfim, é o que tem pra hoje...

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